domingo, 18 de dezembro de 2011

Sobre o que há em mim

por que diabos fico tempos assim sem escrever?

a vida vai acontecendo no caminho e não consigo evitar
nuns dias chove e eu rabisco, durante o banho, toda nossa história no azulejo
então rego as ideias com água encanada e seco com algodão orgânico

e quando faz sol, me escondo no travesseiro
com voz de sono, digo que não posso sair
"essa luz toda ainda vai me cegar"

anoitece
e eu coloco todas minhas roupas para dançar
invento as melhores combinações e ponho o vestido de sempre
não gosto muito dele, mas o que não faço para te agradar?

aí as semanas voam, como nossos aviões de papel
o jornal se acumula na porta
e o café esfria na mesa

só então eu me sento e lembro que passei dias ou até anos sem escrever.


NDS

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Aquarela

te escrevo
sobre aquelas coisas todas
que poetas escrevem para seus amores:

ouço música

rabisco e cochilo

crio uma bagunça inteira


perco as palavras

esqueço a coragem na gaveta
escondo o fôlego no colchão

biscoito e café
na cama e no sofá

e um pouco de você

em cada lugar.


NDS

sábado, 15 de outubro de 2011

Bastilha

cantei baixo minha história
escrevi em branco os sentimentos
abracei
sozinha
o abraço que me prometeu
dancei para trás
esperei em silêncio
olhei o relógio que não uso
diversas vezes
segurei o choro e o sono
segurei seus livros e desenhos
dormi na chuva
chovi na cama
peguei fogo e apaguei
rodei nos sonhos
andei no ar

até cair

na real.



NDS

domingo, 18 de setembro de 2011

Outra para Stella

Stella,

já são outros muitos meses que não nos falamos. Um ano? Uma década? Uma vida? Bem, um ano tem sido uma vida por aqui.
Já não sei mais o que dizer ou perguntar sobre você em suas cartas. Na verdade, parei de receber notícias suas desde que você resolveu se envolver com aquele rapaz amigo nosso. Aquela foi a gota d'água, sabe? Achei que havia certo tom de desafio e vitória velada em sua voz rouca de álcool.
Olha, Stella, você deixou de ser a minha Stella naquele momento. Foi o sinal que eu estava esperando. Um corte no cordão umbilical, uma parede entre nossas vidas, eu diria. Um motivo real para me afastar e cuidar da minha baguncinha por aqui e te apagar do que ainda existia.
Me falaram de você dia desses. Foi algo engraçado que me trouxe boas lembranças por alguns minutos, mas logo em seguida, seu riso e transfigurou em grito e eu não pude fazer outra coisa além de me contorcer e te afastar mais uma vez de tudo isso.
Os olhos, nesse momento, se enchem de lágrimas, ao perceber como tudo ficou. Como foi o final de algo que poderia ter funcionado de modo diferente. Ou não. Ou não. Talvez nunca devesse ter funcionado e essa história foi apenas um livro a mais em nossas vidas, completíssimo, interessantíssimo.
Ah, antes que eu me esqueça, já moro em outra casa. É parecida com aquela primeira de todas. Dessa vez escolhi lilás! E ela é toda cheia de flores e plantas, passarinhos e música! Foi a coisa mais linda que já me aconteceu. E coloco até como mais bonita que você, porque nessa casa eu tenho um verdadeiro porto seguro e um lugar em que posso me abrir e me entregar sem que temer o bote da minha cama, dos meus travesseiros e próprios problemas.
Para falar a verdade, meus problemas desistiram de mim. Isso é uma coisa deliciosa na maior parte do tempo, mas às vezes sinto falta daquela pequena melancolia me envolvendo numa noite chuvosa e me sufocando enquanto tentava ligar para algum conhecido (ninguém me atenderia, acho) ou tentava tomar um daqueles mil remédios que cuidavam de mim na ausência de cuidados.
Parei com todos. Estou limpa de remédios e problemas. Estou limpa de dores, estou limpa de pesares nessa casinha com cor de flor e cheiro de jardim. Estou limpa de todas aquelas coisas ruim que eu mesma criei, que você me proporcionou ou que sempre estiveram em mim, ainda que eu não tivesse notado. Músicas novas, livros novos, amigos novos. Amigos velhos também. Muita poesia por aqui. Muita calma e reflexão.
Não sei se volto um dia para te visitar e dizer tudo isso e mais um pouco olhando dentro de seus amendoados olhos negros, mas pode ter certeza de que no dia em que isso acontecer, vou te procurar e dizer o que anda acontecendo e como estou cuidando de tudo isso sozinha.
É delicioso saber que não preciso da ajuda de ninguém, que não preciso me valer de amores breves nem de carinhos pesados e caros para me sentir bem, para me sentir completa. Foi-se o tempo de tudo isso. Foi-se o tempo de morrer pelos outros e agora só morro um pouco por mim.

Cuide-se,
A.


NDS

domingo, 14 de agosto de 2011

Inquilino

é difícil explicar para os outros
como a tristeza se instala por dentro

e não é questão de eu me acomodar
ou estar desiludida demais com a vida

ela só chega e fica
como o amor também faz
do meu corpo sua casa

mas é só tristeza.


NDS

domingo, 7 de agosto de 2011

Negócio

e por alguns rabiscos em papel canson
te mando meus rascunhos comentados.


NDS

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Repeat

eu tento escrever algo novo todo dia
mas é pura repetição.

de alguma forma, o que tem dentro de mim
é pura repetição.


NDS

domingo, 17 de julho de 2011

Partida

Depois daquele casamento, ela fugiu ainda presa em seu vestido branco.
O mesmo vestido branco que você me prometeu.
E que nós compramos e experimentamos mais de dez vezes antes do grande dia.
E ela só fugiu, segurando acima dos pés aquele excesso fofo de tecido rendado, sem deixar para trás nem um pé do sapato ou um bilhete escrito em guardanapo.
Logo vi que não se tratava de um conto de fadas. Ela fugiu e aquilo era definitivo, com direito a famílias desesperadas e gritos de raiva.
Do canto em que eu observava tudo, vi seus olhos brilhando com a ideia de uma fuga seguida. E você foi. Fugiu com seus sapatos de festa, meu casaco nos braços e nenhum abraço.


NDS

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Notas mentais após um casamento ficcional

Não consigo escrever porque me faltam mais do que palavras.
Me falta aquela sensação de que escrever deixará tudo mais leve.
Me falta aquele abraço depois de um dia difícil ou até um tapa na cara depois de uma idiotice.
Faltam palavras bonitas e feias, faltam lágrimas que completem as lacunas em meu caderno velho. Faltam todos os sentimentos que eu deveria nutrir por você ou outra pessoa qualquer.
E eu escrevo tanto sobre as coisas que faltam e sobram, porque provavelmente sou vazia demais para dizer que existe algo e cheia demais para guardar coisas novas.
Tudo o que eu consigo dizer é que falta sempre algo bom que me dê forças para o próximo dia e sobra sempre dor demais para conseguir esquecer as coisas dessa vida.
Ainda sou nova, sou inexperiente, sou dramática e muito confusa por dentro. Sou uma ruína humana. Tenho problemas, trago problemas, crio problemas. Mas quando você tiver coragem de enfrentar o mundo comigo, eu posso deixar meus problemas - os seus problemas - para trás e começar de novo, sem sobras nem faltas, mas exatamente do ponto certo.


NDS

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Invisível

acordei invisível.
decidi que não poderia ser vista por ninguém.
consegui. passei o dia sem ser vista nem notada.
passei o dia sem preencher retinas nem pensamentos, porque tenho a incrível habilidade de me tornar invisível também a pensamentos.
passei um dia como todos os outros, esquecida e apagada.
nada novo. nada diferente.
andei pelos mesmo lugares e rodopiei na frente das mesmas pessoas. nada. nenhuma reação, nenhum sinal de que eu deveria estar ali ou de que me queriam por perto.
como eu disse: nada novo, nada diferente.
fui dormir invisível.
e passei todos os outros dias do mesmo jeito.


NDS

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Fantasma

escrevo por dentro o que não posso falar
e escondo de mim mesma essas palavras quentes
que não queimam nem ardem
mas são duras e pesadas o suficiente
para seguir em frente

vou andando de lado

- me falta um cavalo alado, que rime mais profundamente que essas
palavras vãs -
e vou encostando, sem querer,
nas paredes que te protegem
tão altas e frias
cruas

um corte no braço

um corte no rosto
e eu continuo andando,
me escondendo
te escondendo
porque há vergonha
além de todo o resto

"não dá, não dá"

mas seus tijolos barrosos
me empurram e pressionam
"dá. dá, sim"
e eu continuo arranhando
o alvo e pálido manto
que me envolve,
fantasma

quase me escapa

sufocado
um grito de dor
mas eu controlo o mundo
e continuo
vou escrevendo em gelo
dentro desse medo branco.


NDS

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Noturno

está anoitecendo
e eu não ando sozinha por aí

a cada dia, anoitece mais cedo

na rua e no coração
e escurece por dentro
passo a passo
no parque e no coreto

eu não ando sozinha

está anoitecendo

em mim
uma noite fria
chuvosa
uma noite fria
tempestuosa

uma noite daquelas

em que só se aguenta
nos braços de outro

a noite não para

avança, criança,
pra cima de mim

e meu medo só lembra de dizer

letra a letra
passo a passo
que não ando sozinha por aí


NDS

terça-feira, 17 de maio de 2011

As malas

perdi o juízo e a fé
perdi os prazos
os males, as malas
nessa viagem sem destino

desatino a chorar

de todas as perdas
a que mais me afeta são as malas

parti numa aventura qualquer

no caminho, nada me entretia
mais do que suas cartas

estavam nas malas

perdi suas cartas

e seus presentes.


NDS

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Lavender

Lavanda.
Chá.

Vai ficar tudo bem, eu digo.

Sirvo um pouco de chá
todos experimentam.

Vozes baixas se confundem

com sorrisos contidos
e xícaras que se tocam levemente.

É uma dança de aromas;

Lavanda é o que sinto
vindo de sua pele fresca.

Tomamos outro gole de chá

Alguma senhora mais desatenta

quebra o compasso com sua xícara
de chá ao chão

Vai ficar tudo bem, dizemos.



NDS

domingo, 1 de maio de 2011

Falta

A gente vai escrevendo
escrevendo
escrevendo
e vivendo no tempo que sobra

Sobra dor,

sobra amor,
sobra rima.
Sobra um pouquinho
daquele perfume
na gola da roupa

E, para (não) ajudar,

me falta sua presença
e sobra seu espaço na cama.


NDS

terça-feira, 19 de abril de 2011

Rua

Chego e te vejo aberta
cheia das luzes e dos cheiros
Me puxando pelos braços e cabelos
me abraçando com suas portas,
me chutando em seus becos estreitos

E você me deixa assim,

tonta
perdida
Seus finais são muito iguais (ou não há um final?)
Seus amores, infiéis aos amantes
e seus amantes, infiéis ao Amor

É sempre assim:

mal chego e já te vejo aberta
com suas luzes cegantes
e seus cheiros enjoados

Não sei andar por seus caminhos

(não sei onde vai dar)

Não sei fechar suas portas.



NDS

terça-feira, 29 de março de 2011

Cedo

Quinta-feira, 3:20am
Acendo um cigarro,
mas não cedo.
O sono não ascende
o fogo, aceso.

4:17am.

Não cedo.
Sem fogo,
sem medo
O sono não vem:
o medo.

5:50am

Já é cedo
(mas não cedo)
Sem fogo,
sem sono,
com medo.


NDS

sábado, 26 de março de 2011

Vivendo a outra parte

Andava por um parque deserto qualquer. Por um momento, pensei em um monte de ameaças, mas depois me perdi no meio de outros pensamentos. Meu desejo era o de ficar sozinha. Mais. Mais sozinha do que todos os dias em que passei sozinha. Queria me livrar de mim e esquecer da vida. Me esquecer. Me apagar da minha memória. Os celulares já não tocavam há algumas semanas e eu sabia que tudo continuaria do mesmo jeito, ainda que eu sumisse dentro daquele parque quase abandonado. Com um pouco de sorte, nada teria sinal lá dentro. Nem meu coração. Com um pouco de sorte, nem os seguranças mais estariam por lá. Tudo com um pouco de sorte. Encontrei um banco esverdeado no meio de uma trilha sinuosa. Naquele lugar, nem o som dos pássaros chegava. Nem o pensamento chegava. Joguei meu casaco e me deitei naquela pedra gelada e reta. A cabeça rodou por alguns minutos e só parou quando eu fechei os olhos. Se aparecesse uma pessoa disposta a me golpear, aquele momento seria o mais propício. Senti o cheiro de floresta entrando no meu corpo, por todos os poros. Senti meu corpo se misturando com a floresta também. Eu poderia morrer aqui, pensei. Continuei com os olhos fechados, respiração profunda, alguns calafrios e um pouco de medo mastigando meus pés. Tudo bem, tudo bem. Tá tudo bem. Meus olhos se contraíram e expulsaram, cada um, um filete dolorido de lágrimas. Fazia tempo que não sentia as lágrimas escorrendo pela lateral do rosto. Cadê você pra me salvar agora? Cadê sua mão quente segurando meu rosto molhado? Cadê seu perfume no meu cabelo? Calma, calma, tá tudo bem. Respira e esquece dessas coisas. Já passou. Espera, cadê aquele pingente que eu te dei? Deixa pra lá. Minha cabeça funcionava numa velocidade anormal. A esse ponto, a respiração já era uma bagunça tão grande quanto eu mesma. Não, não, não tão grande assim. As lágrimas agora desciam mais pesadas e em todas as direções possíveis. Minhas mãos tremiam e o resto do meu corpo já estava dormente. Eu realmente queria evaporar no meio do parque e ficar desaparecida para sempre, perdida no matagal. Toda uma vida cheia de erros e desilusões passeava pelo meu corpo se misturando ao sangue. Toda uma vida de palavras fortes e corações partidos. Vem me salvar, vem me salvar, vem me salvar, por favor! Além de todas essas frases malucas gritando na minha cabeça, comecei a sentir medo. Parecia mesmo que ninguém estava disposto a me salvar. Eu só queria sentir mais uma vez seu abraço. Só queria dormir mais uma vez na nossa cama quentinha. Tomar seu café fraco mais uma vez. Arrumar suas roupas, bagunçar sua cama, derrubar seus livros, gravar nossas conversas, preparar um jantar, tocar uma música, ouvir uma piada, contar meus problemas, rir dos problemas, resolver os problemas. Esquecer os problemas. Te encontrar nos meus sonhos. Te amar de novo. E me sentir amada também. Que bando de pensamentos sem sentido. Que bando de pensamentos infundados. Que dor forte no peito. Que dor forte na cabeça. Que dor forte no corpo. Que dor. Que dor. Que dor. Que saudade maluca. Senti um vento gelado me abraçando de leve, não daquela maneira aconchegante que você sempre fez, mas como se quisesse me expulsar daquele lugar de forma não tão rude. Levantei, mas não voltei para casa.


NDS

quarta-feira, 23 de março de 2011

Poesia sobre a véspera e desculpas já pedidas

Tentei te escrever essa noite
(mais uma daquelas em que você não dorme em casa)
tentei colocar no papel algo mais leve
que o de costume.

Não consegui, sabemos.

Nessa noite, a parede surge de duas cores:
um tom claro de pesares e muito escuro de saudade
No lugar da carta,
os mais diversos sentimentos
misturando-se ao meu penar.

E me resta a cadeira,
a mesa posta,
o chá e o café.
A sobremesa.

Nessa noite, o telefone não toca.


NDS

sábado, 12 de março de 2011

Cidade Jardim

Sempre me perco na avenida
e no elevador.
Sempre me perco na corrida
na rima
na poesia.

Não entendo seu cheiro
em tudo isso:
na camisa aberta
na rua parada
na casa lavada.

E na avenida,
as palavras rimam
de forma
- quase - 
ridícula.

Continuo perdida.

(apagar a poesia, vá lá
mas quem me apaga a memória?)


NDS

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Ventania

vendaval
que na fúria passa
e me leva
ou devolve
quem sabe?
vendaval

em todas as direções

braços se envolvem e se tocam
pianos ressoam temerosos
trançados num ritmo único

mas o rancor não cessa
como a música em nossos ouvidos surdos
e da ventania selvagem
não me restam roupas
ou pudores que me protejam
de seus olhos


NDS

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

mas não é sempre assim que as coisas acontecem?

vandalizaram
meu coração

disseram em algum lugar da cidade
dessa forma bem batida
sobre um acidente na avenida
- e dói
porque eu sei o que é a dor -
com aquelas tintas malcheirosas
escreveram coisas horríveis.
normalmente eu não ligaria,
mas depois desse acidente, tudo importa

(odeio quando você sai
e bate a porta)


NDS

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Fragmentos

eu me sinto quebrada.
como se as palavras se despedaça
s
sem

e com elas, eu.

me sinto errada.

o vento bagunça meu cabelo
e atrapalha minha visão

tudo fica embaçado

(mas são lágrimas)

tudo fica confuso

e minha cabeça não faz outra coisa
senão rodar.

me sinto quebrada

porque simplesmente
não dá para viver

metade

aqui
metade



NDS

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Por que três?

Terceiro dia do ano
terceira noite sem dormir
terceira vez que eu tento
- os erros superam qualquer múltiplo!

Sempre acabo em terceiro lugar.

Todo dia alguém se apaixona

(ou coisa assim, vocês me entendem)
e eu insisto em fugir e me esconder
em quartos de quatro lados
ou em dois lugares ao mesmo tempo

Insisto em operações desarranjadas:

por aqui,
eu trespasso meus problemas.


NDS